Acredito que todos nós já passamos por diversas situações em que tivemos que pedir perdão ou desculpas, como geralmente se diz, para alguém. Não é uma atitude fácil de ser praticada, mesmo quando tentamos tirar o peso soltando um “foi mal” para o ofendido. A impressão que temos é que algumas coisas estão em jogo quando necessitamos nos acertar com alguém, e não estamos abertos a renunciá-las, pois são preciosas demais para se fazer isso.
Por isso, perdoar é algo muito complexo e difícil, pois expõe as lutas que temos internamente e a inclinação pecaminosa do nosso coração. Quando alguém faz algo contra nós, talvez perguntas como estas venham a nossa mente: Como ela pode fazer algo assim comigo? Será que não tem consideração comigo? Confiei nesta pessoa, como poderei confiar novamente? Já cansei de perdoar, até quando terei que continuar perdoando? Será que não pensou nos meus sentimentos? Até quando somente eu terei que sofrer nessa vida?
Ideias distorcidas sobre perdoar
É comum as pessoas terem uma concepção errada do perdão. Possivelmente, elas não conseguem diferir um “me desculpe” de um “foi mal”. Porém, este tipo de erro é extremamente danoso, pois distorce o peso e a profundidade daquilo que Jesus fez por nós na cruz (Efésios 2.13–16).
Outra ideia distorcida é a de que perdoar é uma atitude subserviente, uma fraqueza. Perdoar é uma atitude de compaixão, amor e graça para com o seu próximo, assim como Cristo teve por nós quando ainda éramos seus inimigos (Romanos 5.10).
Perdoar também não tem nada a ver com merecimento. Nós não merecemos o perdão de Deus. Nossos atos de bondade não nos tornam dignos da absolvição de Deus — não há barganha com Deus. Ainda assim, em Sua grande misericórdia, Deus enviou seu Filho ao mundo e o entregou para sermos, por meio dEle, aceitos e reconciliados com o Pai (Efésios 2.4–7).
Perdoando
Como já foi dito, perdoar não é algo fácil, principalmente enquanto não trabalharmos nosso coração em questões como orgulho, ira e soberba. Por isso, para começarmos a entender o que é o perdão, precisamos olhar para Deus e a cruz.
Perdão na Bíblia significa liberar ou cessar, o que nos leva a entender que, quando perdoamos, liberamos alguém da culpa da ofensa ou de algo errado que nos atingiu. A consequência imediata é a restauração do relacionamento quebrado pelo pecado.
O plano de salvação mostra o Pai, gracioso e misericordioso, derramando Sua ira em Cristo para que pudéssemos ser perdoados de nossos pecados de forma eficaz e para sempre. Nossos pecados foram lançados para longe de nós, esquecidos por Deus (Salmo 103.12). É assim que o Pai fez conosco em Jesus, e assim devemos também agir.
Perdoar é parte essencial na vida do cristão. Devemos imitar a forma como Deus nos perdoou em nossos relacionamentos. Efésios 4.32 diz: “... perdoando uns aos outros como Deus os perdoou em Cristo”. Colossenses 3.13 corrobora esta mesma ideia. A chave dessas passagens está em Deus nos perdoar e, por causa do que Ele fez, devemos também fazer o mesmo.
Perdão é restauração
A consequência do perdão é a restauração do relacionamento, e isto é fundamental ao corpo de Cristo e à sua unidade. Se não fosse assim, a igreja estaria comprometida, cheia de inimizades, fofocas, panelinhas e tudo mais que causam dificuldades em relacionamentos entre pessoas.
Pensando ainda sobre a restauração que o perdão traz, muitas vezes o foco do problema é sempre o ofendido pelo dano sofrido. Ficamos com dó da pessoa que foi prejudicada e nos esquecemos do sofrimento que o ofensor passa pelo peso da culpa e dano causado ao ofendido. Devemos buscar restaurar o coração do ofensor com palavras que confirmem a restauração da comunhão, conforto, consolo. Assim também, o ofensor deve declarar sua culpa e súplica de perdão.
É impensável para um cristão não perdoar, e o resultado da falta de perdão produz em nós amargura. Todo este processo pode não ser da forma que imaginamos, mas repetidas situações podem novamente ocorrer e, nesses casos, precisamos nos lembrar de Mateus 18.21, 22, e nos dispormos a perdoar até “setenta vezes sete”.
Portanto, Deus promete aos Seus filhos que se confessarem os seus pecados e pedirem perdão por eles, terão a garantia de que serão perdoados (1 João 1.9) e, dessa forma, estender ao próximo o perdão com restauração.
Exercício de reflexão
Um bom livro bíblico para leitura sobre o tema é o de Filemom. Paulo escreve uma carta para Filemom relatando e intermediando a favor de Onésimo, um escravo que fugiu de seu senhor, Filemom.
Observe na carta estas três partes fundamentais para entendimento, e para que se lembre delas como modelo de um coração que deseja perdoar:
1. Versos de 4 a 7
- Estes versos mostram o caráter espiritual de quem perdoa;
- Filemom era um bom homem, idôneo e de boa reputação entre os cristãos, tendo inclusive ajudado Paulo.
- Paulo, pela boa reputação e compreensão da obra de Cristo que Filemom tinha, sabia que ele teria um coração perdoador, assim como nos também devemos ter.
2. Versos de 8 a 18
- Estes versos mostram as ações de quem perdoa;
- O texto não fala se Filemom perdoou ou não, mas Paulo estava confiante nesta atitude dele;
- Paulo esperava bondade de Filemom para com Onésimo;
- Onésimo estava sendo enviado por Paulo de volta para casa com um coração arrependido, e Paulo tinha certeza de que Filemom o receberia como um irmão e o restauraria da culpa de seu pecado;
- Filemom deveria tratá-lo como um irmão, restaurar o relacionamento;
- Nossa atitude deve ser como a de Filemom, restaurar os quebrantados pela culpa, restaurar a comunhão como um irmão.
3. Versos de 19 a 25
- Além de restaurar, o perdão de Filemom também renova a alegria do coração consumido pela culpa e tristeza de Onésimo;
- Traz de volta a união que o povo de Deus deve ter em, e por causa de Cristo;
- Filemom não tinha motivos para não perdoar Onésimo. Como bom servo do Senhor, reconheceu o que Jesus fez por ele, e replicou em obediência a Deus o perdão a Onésimo.
Que Deus abençoe a sua vida com humildade, graça e misericórdia, para que o perdão aprendido em Jesus seja praticado para união e bênção do corpo de Cristo.
Editorial de William Rubial
Muito bom. Parabéns William.