“Filho, vai arrumar sua cama...”, diz a mãe. Do outro cômodo, o filho fala: “Tô indo, mãe...”. Depois de um tempo, a mãe passa pelo quarto, e vê a cama ainda bagunçada. Um pouco mais tarde, ela diz: “Filho, hoje você vai lavar a louça...”. O filho, emburrado, mas “sem reclamar”, pega a esponja e começa sua tarefa. Esse é um dia comum, numa família comum. Talvez, até seja uma família sem grandes problemas, com filhos que obedecem mais do que a média.
Ainda assim, há algo de errado que muitas vezes relevamos por ser algo “normal da idade”, mas que não muda o fato de que há uma quebra no padrão que Deus estabeleceu desde o início. Quando Deus dá sua Lei ao povo, Ele é bem claro sobre como os filhos devem tratar seus pais: “Honre o seu pai e a sua mãe” (Êxodo 20.12a).
Estamos acostumados com o termo. Estamos familiarizados com o texto. Mas a palavra honra não costuma ser muito “prática” para nós. Afinal de contas, o que significa honrar meus pais? E como eu posso fazer isso mesmo já sendo mais velho, fora de casa, casado?
Obediência
O primeiro conceito por trás de honrar os pais é a obediência. Essa é, com certeza, a primeira coisa que pensamos quando falamos sobre honrar os pais. No entanto, há algo intrínseco à ideia de honra que por vezes se perde na palavra obediência. Quando falamos de honra, carregamos o conceito de uma dedicação interna e de algo que comunica a importância de quem é a autoridade. Nesse sentido, creio que faz sentido qualificarmos a obediência que Deus nos chama a ter para com os nossos pais como uma obediência inteira e imediata.
Inteira porque vai além de algo externo, tocando nossas motivações e intenções. Não obedecemos só externamente, mas por completo. Não obedecemos apenas buscando nossos próprios interesses, mas para o benefício daquele que nos deu a ordem.
E imediata porque deve acontecer na hora em que a ordem foi dada. Isso parece algo óbvio, mas é interessante como deixamos passar. É muito comum vermos pais falando: “Vou contar até três, hein?!”. No três, o filho para e “obedece”. O problema é que a obediência tardia não é obediência, é desobediência. A obediência que honra os pais é imediata, porque ela reconhece a autoridade dos pais e sabe que sua resposta é uma forma de comunicar o valor dos seus pais.
Mas e quando eu já não estou mais sob o cuidado dos meus pais? Como continuar demonstrando honra? Preciso seguir obedecendo de forma inteira e imediata?
A autoridade dos pais sobre os filhos é sazonal, mas a honra é permanente, independentemente se os pais são cristãos ou não. Deus nos chama a sempre honrar nossos pais; Ele não nos chama a obedecer ao nosso pai e à nossa mãe, uma vez que estabelecemos a nossa própria casa. Esta distinção (e transição) é crítica para honrarmos de forma saudável os nossos pais, especialmente quando partimos para formar uma nova família: “Por isso, o homem deixa pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne” (Gênesis 2.24). Para honrar os pais como Deus exige, o marido ou a esposa deve abandoná-los como Deus exige, estabelecendo limites claros que não existiam antes. A partida é vital para a fidelidade à medida que envelhecemos, amadurecemos e nos casamos, e a honra real e duradoura também é igualmente vital. Ambas fazem parte da nossa caminhada como filhos.¹
Ouvir e Cuidar
Nesse sentido, creio que duas palavras que capturam a ideia de honra aos pais no contexto “fora do lar” são ouvir e cuidar.
"Escute o seu pai, que o gerou, e não despreze a sua mãe, quando ela envelhecer."
(Provérbios 23.22)
Não é honroso ignorar os pais e desprezar aquilo que eles têm a nos dizer. Eles tanto têm mais experiência de vida, quanto nos conhecem muito bem. É honroso e sábio ouvi-los de coração aberto.
Além disso, é responsabilidade dos filhos cuidarem dos seus pais, independentemente de sua idade e da idade de seus pais.
“Quem maltrata o seu pai ou manda embora a sua mãe
é filho que causa vergonha e traz desonra.”
(Provérbios 19.26)
O filho que deixa de cuidar de seus pais traz desonra — aos pais e a Deus. Ele deixa de comunicar a importância e o valor dos pais e da família como Deus criou. Ele ignora a Deus e rejeita a sabedoria de Deus, que colocou seus pais sobre ele. Ele deixa de refletir o cuidado amoroso que Deus nos chama a ter pelo próximo. Portanto, embora a honra aos pais seja diferente na prática, dependendo da fase de vida em que vivemos, ela sempre é um mandamento que somos chamados a cumprir.
Finalmente, se o papel do pai é visto de forma clara em Deus Pai, o papel do filho é demonstrado com perfeição em Jesus. Em tudo o que fez, Jesus honrou ao Pai. Ele veio para fazer a vontade do Pai, e para glorificar ao Pai. Ele obedeceu de forma completa, inteira e imediata. E por causa da obediência de Jesus, somos então capazes de imitá-lO — obedecendo ao Pai e honrando nossos pais.
Editorial de Gustavo Santos
¹ SEGAL, Marshall, Honor the Parents God Gave You.
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